Continuando a sequência de matérias sobre as seis primeiras histórias de Dylan Dog, que sairão no primeiro Omnibus do personagem, chegamos ao segundo volume: Jack, o Estripador. Esta história foi publicada no Brasil em 1991 pela Editora Record e agora estará disponível nas 604 páginas do Omnibus lançado pela Editora Mythos.
Aqui o intuito é nos aprofundar mais através das várias referências ao cinema e à cultura presentes na obra de Tiziano Sclavi. Para cada matéria foi criado um Cartaz de filme, do qual tem alguma relação com a história mencionada. Neste segundo, o cartaz foi inspirado no filme “Do Inferno” (2001), estrelado por Johnny Depp e Heather Graham, baseado na obra homônima em quadrinhos de Alan Moore e Eddie Campbell.
Do Inferno se passa na Londres de 1888, quando prostitutas são caçadas, assassinadas e mutiladas por um assassino chamado Jack, o Estripador. Assassino este que no mundo real se tornou famoso ao matar pelo menos cinco prostitutas no bairro Whitechapel. Sua identidade nunca foi definitivamente revelada, apesar de hipóteses e especulações. É com base neste personagem que Sclavi nos traz a segunda história de Dylan Dog.
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Dylan Dog – Jack, o Estripador. Publicado originalmente em Dylan Dog – Jack, lo Squartatore em 1º de novembro de 1986. Roteiro de Tiziano Sclavi, arte de Gustavo Trigo e capa de Claudio Villa.
Mesmo que se apresente como um terror, esta história se revela um mistério à la Agatha Christie. Na sessão espírita da sequência inicial, onde algumas pessoas trazem de volta o espírito de Jack, o Estripador, entre os participantes está Margareth Christie, referência à própria Agatha. Elizabeth Dewey, uma possível ligação à Thomas B. Dewey, autor americano de romances policiais hardboiled. E Lord Dunsany, escritor, poeta, dramaturgo e ensaísta anglo-irlandês.
O trabalho de Christie inspira a estrutura narrativa da edição. A sequência de assassinatos disfarçados com o objetivo de confundir e afastar suspeitas lembra o Serial Killer A.B.C., de “Os Crimes ABC”, romance de Christie publicado em 1936.
Em “Jack, o Estripador”, somos apresentados a uma linda garota que contrata Dylan Dog para inocentá-la de um crime. Ela é Jane Sarandon, enteada da vítima, Sarah Sarandon que, segundo Jane foi morta pelo fantasma de Jack, o Estripador. Já pegou a referência seguinte certo? O sobrenome das duas é inspirado em Susan Sarandon, protagonista do filme Rocky Horror Picture Show.
Um fato interessante é que na página 17, quando Jane entra no corredor com as estátuas do escritório de Dylan, ela é atingida na cabeça por uma estátua de… Jack, o Estripador.
Jane trabalha em um Museu de Cera como vigia noturno, e lá temos várias imagens cinematográficas de terror e fantasia. A primeira estátua é Lon Channey (1883-1930) em sua interpretação de O Fantasma da Ópera de 1925. Em seguida temos Napoleão Bonaparte, o monstro Frankenstein e Adolf Hitler.
O pregador de rua que Dylan e Bloch encontram no parque grita: “Eu lhes digo que o diabo foi despertado! Jack, o Estripador, é apenas um dos seus nove bilhões de nomes. O diabo voltou para nós porque nós o chamamos com nossos pecados”. Dylan pergunta a Bloch: “Mas não é Deus quem tem nove bilhões de nomes?”.
É uma referência a uma história de ficção científica de Arthur C. Clarke, “Os Nove Bilhões de Nomes de Deus”. A obra foi publicada em diversas coleções e Clarke é considerado o iniciador do realismo fantástico.
A cena em que Dylan e Jane assistem no cinema, sem fazer referência explícita, pode ser uma homenagem à famosa sequência do elevador do filme “Dressed to Kill” (1980), de Brian de Palma (No Brasil, Vestida para matar).
Embora Dylan seja declarado abstêmio e ex-alcóolatra, na página 28 o vemos bebendo uma cerveja. Perdoável, já que era um personagem em construção, mas este tipo de exceção, intencional ou não, aparece em várias edições. Em algumas reimpressões estas cenas foram sendo corrigidas sugerindo um descuido involuntário.
O assassinato de Lord Dunsany é uma homenagem explícita à história em quadrinhos “O Encontro em SevenOaks”, com roteiro de Floc’h e desenhos de Rivière. Este quadrinho já foi publicado pela Editora Meribérica/Líber.
Jack, o Estripador retornou em maio deste ano em Dylan Dog Color Fest #49 – Cartas do Pesadelo, com roteiro de Giovanni di Gregorio e desenhos e cores de Emiliano Tanzillo. Em 1888, um assassino feroz ronda Londres, assina cartas delirantes e endereça à Scotland Yard. A cidade é tomada pelo terror e a polícia, através do Doutor Hyde contrata Dylan Dog, um investigador com um passado de vício em ópio. Uma alusão ao vício em cocaína de Sherlock Holmes. Para desmascarar o “monstro”, Dylan terá que enfrentar primeiro os seus próprios demônios.
A resolução do mistério ao longo dos anos
Em 1888, após a sequência de crimes perpetrada pelo assassino, o Dr. Thomas Bond a pedido da polícia de Londres traça um perfil da personalidade de Jack. A motivação dos assassinatos foi provavelmente sexual, mesmo que as vítimas não tenham sido estupradas. O assassino age sob o impulso de profunda raiva e ressentimento em relação às mulheres. Ele não é cirurgião nem açougueiro, pois seus cortes imprecisos revelam que ele não possui conhecimentos anatômicos.
O chefe da polícia, Melville MacNaghten, suspeitou de cinco homens, como escreveu num memorando de 1894 (tornado público em 1959). O último suspeito, William Bury em 1889, um ano após os crimes, estrangula a esposa, uma ex-prostituta. Então ele a estripa e a esconde em um baú. Descoberto, ele é enforcado.
Mas, em 2006, uma equipe de médicos coordenada pelo Dr. Ian Findlay, da Universidade Australiana de Brisbane, conseguiu extrair DNA da saliva seca atrás do carimbo de uma carta assinada por Jack, o Estripador. Só foi possível reconstruir parcialmente o DNA, que muito provavelmente seria de uma mulher.
Em 2012 então é publicado na Inglaterra “Jack, o Estripador: A mão de uma mulher”, que retoma essa hipótese. O autor, John Morris, um ex-advogado de 62 anos, afirma que o serial killer era na verdade Lizzie Williams, esposa do ginecologista real Sir John Williams, que também acabou entre os suspeitos e foi rapidamente exonerado. Lizzie, na época com 38 anos, teria matado e estripado as cinco prostitutas porque não podia ter filhos e sofria com isso. Três delas tiveram os úteros removidos, corroborando a esta hipótese.
O fato de nenhuma vítima ter sido violada pode indicar que o assassino era de fato uma mulher; além disso, em uma cena do crime foram encontrados botões de uma bota feminina e em outra uma peça de roupa feminina que não pertencia à prostituta.
Em 2013, Antonia Alexander, descendente da última prostituta assassinada, Mary Kelly, identificou a foto colocada em um medalhão que Mary havia recebido de presente: é a de seu amante Sir John Williams, o médico real casado com Lizzie. A hipótese de os dois serem amantes já havia sido levantada pelos investigadores na época. De acordo com Alexander, não Lizzie, mas John Williams era Jack, o Estripador.
Porém, o assassinato de Mary Kelly, o último da série, foi de longe o mais brutal, dadas as más condições em que seu corpo foi encontrado. Pode-se dizer que, Lizzie Williams teria gostado de eliminar Kelly sozinha por ciúmes, mas, para não lançar suspeitas sobre ela (e também para “desabafar” a raiva que a devorava), primeiro matou as outras prostitutas e escreveu cartas para os jornais, a fim de criar um serial killer masculino imaginário na mente dos investigadores.
Depois de ter torturado sua rival amorosa até a morte, ela não tinha outro motivo para continuar matando. O fato de apenas a última vítima ter sido morta em casa, onde só ela poderia estar, é indicativo; e não, como todos os outros, na rua onde você nunca sabe que prostituta poderia encontrar.
Alan Moore passou longe dessa teoria, já que em sua história, ele segue uma teoria do final da década de 1970, quando Stephen Knight propõe que as mortes estão ligadas à Coroa Britânica e que elas são uma tentativa de ocultar o nascimento de um bebê real ilegítimo do Príncipe Alberto Vitor, neto da Rainha Vitória. Toda esta conspiração estava conectada com a Maçonaria e com a própria Rainha.
Ao final da história de Dylan Dog, “Jack, o Estripador” vemos que o motivo dos crimes é realmente mais Agatha Christie do que os reais motivos de Jack. Porém, percebemos que quem mais chegou perto da teoria mais provável foi o próprio Tiziano Sclavi, mesmo com outros personagens e motivos.
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