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Caminho para Le Storie! Edições 6 a 10

Aqui na Confraria tínhamos: “Séries Bonelli que talvez nunca vejamos no Brasil”, que se tornou altamente datada porque felizmente surgiram várias editoras que começaram a publicar as séries que comentamos. A intenção dessa nova empreitada é apresentar todas as edições de Le Storie. Uma série altamente rica em sua proposta com histórias incríveis e que valem a pena serem publicadas no Brasil.

Já falamos das edições 1 a 5 AQUI. E continuamos a empreitada:

Le Storie #6 – Retorno a Berlim (Ritorno a Berlino)

Roteiro: Paolo Morales

Arte: Paolo Morales e Davide de Cubellis

Capa: Aldo di Gennaro

 “Osiris 2”… o que é isso?

Ninguém parece saber, mas é certo que dizer estas palavras em público pode acabar lhe custando a vida. O jovem Max, um repórter de Berlim, foi salvo da morte certa por acaso, ele está ciente disso. René, um senhor idoso que, sob o aspecto inofensivo, esconde as habilidades mais mortais de um agente secreto… Afinal, o que une esses personagens, aparentemente distantes?

O sexto número de Le Storie gira em torno de um legado. Algo irônico, já que foi a última história escrita por Paolo Morales, levado por uma doença quando ainda não tinha nem sessenta anos. Na história, a Berlim libertada fica em segundo plano e o ritmo da ação é essencialmente íntimo e silencioso, contrabalanceado pelas reverberações festivas da libertação de Berlim em 1989.

O desenvolvimento da história se passa na Berlim nos dias de hoje, e os eventos do passado e presente vão se aproximando até se fundirem.

Os desenhos detalham as figuras e não se perde muito em paisagens e ambientes. Os personagens Max e Helen tem ótimas personalidades, a ponto de “saírem” das páginas. Uma ótima história de um artista que fará falta.

 

 

Le Storie #7 – A Patrulha (La Pattuglia)

Roteiro: Fabrizio Accatino

Arte: Giampiero Casertano

Capa: Aldo di Gennaro

Vietnã, 1967. O capitão Artz tem uma desagradável missão dada por seu superior direto: entrar na selva da Indochina – no meio daquela guerra absurda – para recuperar uma patrulha que havia desaparecido um ano antes. Um punhado de soldados para recuperar outros, enviados para o desconhecido, à mercê da morte e de seus medos…

A Guerra do Vietnã é uma fonte de inspiração para autores de qualquer campo artístico: diretores, escritores, músicos e roteiristas fizeram dela parte das histórias do imaginário contemporâneo. A Patrulha, se passa nesse cenário, onde Fabrizio Accatino, auxiliado nos desenhos por Giampiero Casertano, nos fala sobre a missão da equipe comandada pelo Capitão Artz, enviada à selva em busca da Foxtrot A patrulha 2/1, que desapareceu misteriosamente.

 

Accatino cria uma boa história, bem caracterizada e sem dúvida cativante. Que mistura o drama da guerra com uma sutil, mas inquietante veia de horror, onde a dúvida e a incerteza se instala no leitor se tornando a principal fonte de tensão. Uma história que não decepciona até o dramático e comovente final.

A Patrulha tem suas raízes em filmes de guerra, não só em Apocalypse Now, mas principalmente baseada no filme coreano R-Point, dirigido por Su-Chang Kong em 2004, do qual retoma quase inteiramente a ideia e a sequência de eventos.

A luz e sombra na obra de Casertano conquistam. Algumas páginas inteiras e quadros cuja estrutura e composição são bem detalhadas, valem muito a pena.

Esta Le Storie tem um ótimo timing narrativo e fonte de reflexão sobre a guerra. A patrulha perdida é uma metáfora para uma geração perdida, engolida por um horror inimaginável. Uma “geração perdida” enviada ao matadouro para reverberar o colonialismo ocidental.

O final, como já dito, é comovente, onde a correspondência entre um dos integrantes da equipe do Capitão Artz e sua mãe acompanha os melancólicos quadrinhos de encerramento, lembrando quantas famílias perderam seus filhos em uma das incontáveis e inúteis guerras.

Le Storie #8 – Amor Negro (Amore Nero)

Roteiro e desenhos: Gigi Simeoni

Capa: Aldo Di Gennaro

O comissário Vitalis deve investigar o assassinato brutal de Francesco, irmão mais novo de sua esposa, Ada. O caso, no entanto está fadado a se complicar quando um cenário sobrenatural surge para quebrar as regras da investigação científica. O mundo das trevas em uma alma negra cresce…

Gigi Simeoni nos lança à Milão na virada do século XX com a história “Amor Negro”. A história é abundante em registros literários, que mesclam o panfleto feminino da época, processual e horror, tudo incluído em um intrigante cenário histórico. Porém, o desenvolvimento da história se precipita em um final abrupto que deixa o leitor perplexo.

A linguagem e a prosa são modernas, com diálogos sem pretensão, mas elegantes em nos situar no ar retro da Milão do início do século XX. Se o assunto é ambicioso, o roteiro é corajoso. Mistura o amante e vingativo, além do amor entre o super-policial e a bela deficiente sensível, com aspectos sobrenaturais. Estes últimos são particularmente originais, e graficamente detalhados com maestria.

Não faltam ideias em Amor Negro: das simbologias florais à representação mediúnica da vida após a morte. Porém existe a compressão de muitos elementos no espaço estreito de uma revista de quadrinhos, com número de páginas determinadas.

Por fim, Amor Negro é uma história em quadrinhos que pode ser apreciada e confirma a qualidade de toda a série Le Storie.

Teaser:


Le Storie #9: Impasse Mexicano (Mexican Standoff)

Roteiro: Diego Cajelli

Desenhos: Matteo Cremona

Capa: Aldo Di Gennaro

Ao longo da fronteira entre os Estados Unidos e o México – terra de “contrabando”, drogas e migrantes – um homem emerge do esquecimento após ter tocado na morte. Quem é ele realmente? Quem curou suas feridas? O que esconde em seu passado? A memória redescoberta trará consigo um cenário tenebroso de violência e vingança criminosa… mas também as sombras de presenças muito mais misteriosas. Algo que vem de longe: do abismo do tempo e do espaço…

Antes de tudo, vamos entender o que é um Impasse Mexicano, ou  Mexican Standoff, nome original da trama: Sabe nos filmes de ação quando todos levantam as armas e ficam apontando um para o outro? É isso, um impasse mexicano.

Reyes é um bandido que deveria estar morto, mas foi encontrado vivo depois de meses no deserto: em sua pele há um vestígio de cura inexplicável.

Além disso temos os seguintes elementos: Um traficante de drogas que eliminou todos os rivais e estende sua rede para além da fronteira; Estrangeiros alojados em uma base secreta dos EUA, que não são prisioneiros, mas dão ordens; Luzes que descem do céu e memórias de vidas passadas; Reyes, que pode não ser o que parece ser. Tudo isto, Diego Cajelli traz para o nono número de Le Storie.

Nos quatro quintos da história o roteiro acumula ideias: confronto dentro de uma gangue criminosa, exploração do trabalho de crianças sem futuro, contraste entre o frenesi da cidade e a serenidade das aldeias que parecem esquecidas pelo presente. Planos de vingança, amizade viril, amores perdidos, intriga, corrupção e traição. E então os alienígenas não são realmente alienígenas, entidades que não percebem o tempo, os poderes psíquicos e a transmigração das almas.

O ritmo da narrativa é administrado entre cenas de ação em alta velocidade e momentos de tranquilidade, onde são inseridos os elementos que criam expectativas. Os personagens são definidos de forma a sugerir algo mais do que é mostrado: seu passado, suas motivações, como e porque se encontraram naquela confusão de acontecimentos.

Matteo Cremona, muito eficaz nas cenas de ação, sempre construída com o ritmo adequado e com uma pincelada que comunica bem a velocidade, e capaz de transmitir, com o branco, uma sensação palpável de calor, o que aumenta a tensão.

Aí quando chega no final… a estrutura até então bem construída desmorona. Em um curto-circuito estrutural em que os elementos de mistério se revelam instrumentos para administrar um final, não dão sentido à história. Somos deixados cheios de perguntas e a dúvida de ter perdido algo no caminho.

Dá a impressão de nos encontrarmos em um episódio piloto, ou uma história pensada para uma duração muito maior e depois comprimida, sem uma revisão que adaptasse o enredo. Hábil em agradar as expectativas durante o percurso e eficaz no impacto gráfico, a história deixa, junto com muitos momentos intensos, a sensação de uma oportunidade perdida.

Le Storie #10 – Ninguém (Nobody)

Roteiro: Alessandro Bilotta

Arte: Pietro Vitrano

Capa: Aldo Di Gennaro

Ninguém… é assim que todos o chamam. “Ninguém”, o louco, o bêbado, o visionário. Como suspeitar que o maior explorador, o navegador mais incansável, se esconde naquele homem à deriva? No entanto, é assim, e Ninguém vai provar para o mundo inteiro, lançando-se em uma incrível aventura – povoada por monstros e heróis lendários – em busca do amor perdido.

Esta é a segunda obra de Le Storie com roteiro de Alessandro Bilotta e narra uma possível reescrita da saga de Ulisses, da Odisseia. Com elementos presentes em quase todas as enciclopédias de leitores ocidentais (Julio Verne, Salgari, Melville), Bilotta constroi uma história que permanece em equilíbrio entre a realidade e o sonho, entre a história dos marinheiros e uma simples viagem mental, num turbilhão apaixonado e emocionante, em que Ninguém, um novo Ninguém, procura a sua Penélope.

O autor gosta de inserir personagens e citações, verdadeiras homenagens às suas paixões, mesmo às custas de fazer da história um simples divertimento, uma homenagem às leituras do passado.

O desenhista estreante na Bonelli, Pietro Vitrano, não fica mal graças ao seu estilo denso, rico em tintas e preto, mas com boa legibilidade, como manda a tradição Bonelli.

 

Até os próximos Le Storie!

O Caminho para Le Storie: Edições 1 a 5

Foi em outubro de 2012 que saiu o primeiro número de Le Storie. Uma das últimas decisões editoriais de Sergio Bonelli antes de sua morte, meses depois. A nova série foi uma ideia de Mauro Marcheselli que tinha a intenção de resgatar uma tradição importante da Bonelli. A série cult Um Homem, Uma Aventura, histórias onde grandes mestres dos quadrinhos italianos e internacionais contavam aventuras de heróis de todo o mundo e até de épocas diferentes.

A série Le Storie nasceu com poucas características Bonelli. Não era uma série, ou uma minissérie dedicada a um personagem, ou a grupos de personagens, mas uma série composta de histórias independentes e de gêneros muito diferentes. Muitas vezes os gêneros foram misturados, noir e horror, thriller psicológico e aventuras de piratas, ação de detetives à ficção científica, além de várias com fundo histórico.

A Le Storie hoje, já passa de 100 edições e a partir da 101 realiza um resgate histórico dos antigos personagens Bonelli. O fato é que cada história é única e vale muito a pena ser lida.

Le Storie é praticamente uma série experimental, que sabe arriscar e por isso vai de encontro a gostos diversos e muitas vezes acaba por atrair leitores diferentes. A própria Bonelli sabe disso e ao licenciar para as editoras brasileiras, por exemplo, não negocia a série inteira, mas sim uma edição de cada vez. Pois cada uma tem um potencial diferente. Há certos casos que formam uma sequência, como o caso do retorno de Cassidy, Napoleone ou Hollywoodland, que foram publicadas em uma sequência de edições.

No Brasil já foram publicados quatro Le Storie, duas em Chambara (Panini), Mugiko e Sangue e Gelo pela Trem Fantasma e em breve sairá Sangue dos Mortais (Red Dragon). Com certeza, em breve sairão mais.

Na Confraria Bonelli tínhamos a série de matérias: “Séries Bonelli que talvez nunca vejamos no Brasil”, que se tornou altamente datada porque felizmente surgiram várias editoras que começaram a publicar as séries que comentamos por aqui. E agora, vamos apresentar todas as edições de Le Storie. Uma série altamente rica em sua proposta e que todas as edições tem motivos para serem publicadas no Brasil.

Servirá como um guia para leitores e editoras, uma apresentação, um Caminho para Le Storie.

Começando pelas cinco primeiras histórias publicadas na série:

Le Storie #1 – O Carrasco de Paris (Il Boia di Parigi)

Roteiro: Paola Barbato

Desenhos: Giampiero Casertado

Capa: Aldo Di Gennaro

Paris, 1790. A Revolução Francesa está varrendo o Antigo Regime, mas o fim dos privilégios marca o surgimento de novas intrigas políticas: tempos de terror estão chegando!

 

Charles-Henri Sanson foi responsável diretamente por quase 3.000 execuções, incluindo a do rei Luís XVI, por isso ficou conhecido como “O Carrasco do Rei”. Mas agora – tendo se tornado “O Carrasco do Povo” – está se preparando para ter sua própria cabeça cortada. À sombra da guilhotina, é contada sua sombria história. Uma história de morte e amor, de poder, justiça, solidão e vingança!

O Carrasco de Paris é um excelente ponto de partida para Le Storie. A associação de Barbato e Casertano é uma das pérolas mais brilhantes de toda a série. Aqui vemos uma história de atrocidade e humanidade singular. Barbato cria uma ficção histórica nos apresentando versões de várias figuras históricas como Robespierre, que aqui é tratado como um demagogo que acabou caindo no mesmo lugar dos nobres que tanto criticava.

Henri Sanson, pelo seu hábito e familiaridade com a morte entende muito a vida. Existe uma anedota na França sobre sua pessoa a qual diz que, após se aposentar do posto de carrasco, teria encontrado casualmente com Napoleão Bonaparte, o qual lhe perguntou sobre como conseguia dormir em paz, depois de tantas execuções. A resposta dele foi: “Se os imperadores, os reis e os ditadores podem dormir bem, por que eu não conseguiria o mesmo?”

Barbato nos mostra que gestos, palavras e atos de um torturador profissional podem nos mostrar uma humanidade extraordinária. Mesmo com a vida do carrasco em primeiro plano, a autora não perdeu a oportunidade de olhar para a miséria da população parisiense ou para a sede de poder que alguns grupos de revolucionários desenvolvem. Casertano acerta em nos mostrar quadros com riqueza de detalhes históricos e muita qualidade nos ângulos e momentos desenvolvidos.

A história de Sanson já foi contada no mangá Innocent de Shinichi Sakamoto e publicado pela Panini em 9 edições.

Le Storie #2 – A Redenção do Samurai

(La Redenzione del Samurai)

Roteiro: Roberto Recchioni

Arte: Andrea Accardi

Capa: Aldo Di Gennaro

Jubei desobedeceu as ordens de seu senhor e por isso deve morrer. Cabe ao jovem Tetsuo encontrá-lo e entregá-lo ao seu destino. Mas, ao longo do caminho, uma revelação inesperada mudará o curso de sua missão.

Esta história já não é mais inédita, saiu no Brasil pela Panini em Chanbara em formato americano, capa dura e totalmente colorida. O roteiro de Recchioni (Dylan Dog: Mater Morbi), é afiadíssimo. A vingança é o mote principal das duas histórias, mas aqui falaremos apenas da primeira: A Redenção do Samurai.

Ichi é um velho cego, sem dentes que precisa da ajuda dos outros, e acaba oferecendo sabedoria e conhecimento nas artes da guerra. Uma referência clara a Zatoichi, personagem que ficou famoso por Takeshi Kitano no filme de 2003, mas já muito famoso no Japão por ser uma figura mitológica japonesa. O conto se passa no Japão feudal e demonstra muita beleza e a crueza desse momento histórico em belíssimos desenhos de Andrea Accardi.

A história se move rapidamente, com apenas um flashback, pois cada momento é essencial. Os personagens carecem de uma maior introdução, mas isso é compensado em parte pelo fato de serem em sua maioria estereótipos, compreendidos facilmente pelos leitores, como o sensei e seu aluno, etc.

O ritmo da narrativa busca mais o cinema do que o mangá. Usa os tempos típicos do cinema japonês: cheio e vazio, suave e forte, silêncio e ação. Há momentos contemplativos e brilhantes de Accardi, como também velocidade e violência nas cenas de ação entre os samurais. Um volume frenético para uma série Bonelli!

Le Storie #3 – A Revolta dos Sipais (La Rivolta dei Sepoy)

Roteiro: Giuseppe De Nardo

Arte: Bruno Brindisi

Capa: Aldo Di Gennaro

Esta Le Storie tem como pano de fundo a Índia colonial em meados do século XIX. Temos aqui uma história de amor entre Elisabeth e Jim. Um romance que corre o risco de ser esmagado pelo clima de rebelião que vem crescendo no país.

A Rebelião Indiana de 1857 (também conhecida como Revolta dos Cipaios, Revolta dos Sipais ou Revolta dos Sipaios) foi um período prolongado de levantes armados e rebeliões na Índia setentrional e central contra a ocupação britânica. Pequenos incidentes de descontentamento em janeiro foram os precursores da rebelião. Posteriormente, uma revolta em grande escala iniciou em maio e tornou-se uma guerra aberta nas regiões afetadas.

Os sipais (do híndi shipahi, “soldado”) eram soldados indianos que serviam no exército da Companhia Britânica das Índias Orientais, sob as ordens de oficiais britânicos.  Os sipais estavam descontentes com certos aspectos da vida militar. Embora recebessem um soldo baixo, eram obrigados a pagar pelo transporte de sua bagagem quando eram deslocados para teatros de operações distantes. Outro problema era o recrutamento de indianos de outras castas além da brâmane e da xátria. Ademais, em 1856, os sipais foram deslocados por mar para operações na Birmânia – a viagem marítima resultava em grande impureza para os membros das castas altas.

O motivo mais conhecido da rebelião foi o uso de gordura animal na fabricação (impermeabilização) dos cartuchos do novo fuzil Lee-Enfield. Os sipais haviam sido treinados para rasgar o cartucho com os dentes para inserir o conteúdo no fuzil; os soldados hindus e muçulmanos suspeitavam que a gordura empregada era o sebo (de boi, abominável para hindus) ou a banha (de porco, abominável para muçulmanos) e, em 1857, recusaram-se a usar os novos cartuchos. Os britânicos passaram a fabricá-los com cera de abelha ou óleo vegetal, mas os rumores continuaram.

Em 1857, ocorreram incidentes como um ataque de um sipai contra um superior britânico e a recusa em usar os cartuchos. A punição foi dura: o regimento onde ocorreu o ataque foi dissolvido e os sipais que recusaram os cartuchos foram condenados à execração pública e a dez anos de trabalhos forçados.

Riquíssimo pano de fundo, não é mesmo? Mas Giuseppe de Nardo nos traz um verdadeiro Cineromanzi, uma vertente do cinema que fez muito sucesso nos anos quarenta. Uma história de amor e aventura mas contada de maneira simples, como em fumettis realizados há 60 anos atrás. Os desenhos de Bruno Brindisi se esforçam para colocar o leitor no cenário histórico, mas a Índia é vista em poucos momentos, a trama é mais focada em rostos do que nos sets.

A história seria melhor se realmente se esforçasse em ser contextualizada em um período tão importante. Algo que Alfredo Castelli faz magistralmente. Esta terceira edição é uma das mais fracas de Le Storie.

Le Storie #4 – Proibido Fumar (No Smoking)

Roteiro: Pasquale Ruju

Arte: Carlo Ambrosini

Capa: Aldo di Gennaro

O jogo… Ângelo perdeu e agora deve muito dinheiro a um chefe perigoso. Apenas Eddie pode salvá-lo. Eddie, um “cara durão”. Mas… por que pagar a dívida quando você pode matar o credor? Essa ideia é um caminho para o inferno, principalmente quando um louco maldito como Sonny Spataro fica no caminho…

Chicago dos anos 30. Logo na abertura da edição Ângelo e Eddie estão invadindo o local de jogos clandestinos de Frank Ventura, defendido pelo infame Sonny Spataro, que tem o apelido de “O Lobisomem” por sua ferocidade. O início é um bom presságio, mas o roteiro de Pasquale Ruju não é muito envolvente. A narrativa é clássica demais e torna a leitura tediosa. E nota-se que a história tem inspiração clara no filme Os Suspeitos, de Bryan Singer (The Usual Suspects, 1995).Manuela, a única personagem feminina da trama é apresentada como forma a parecer importante para o desenrolar da trama, mas é esquecida e deixada sem uso até o final.  Até os desenhos de Ambrosini, variam entre quadros incríveis e outros mais sem inspiração. É a primeira história de máfia de Le Storie, e pelo tema vale muito a leitura pois tem vários elementos das clássicas tramas de gângsteres.

Le Storie #5 – O lado escuro da Lua (Il lato oscuro dela luna) ou o melhor título “The Dark Side of The Moon

Roteiro: Alessandro Bilotta

Arte: Matteo Mosca

Capa: Aldo di Gennaro

Lloyd realizou seu sonho de infância: Se tornou um astronauta a caminho da Lua… Mas, de repente, a aventura se torna um pesadelo. Como é possível que seus companheiros tenham desaparecido sem deixar vestígios? Por que sua mente está cheia de lembranças dolorosas. Talvez as respostas estejam no lado escuro da Lua!

Em 19 de novembro de 1963, Lloyd Clark realizou seu sonho: a bordo do Selene 7, na companhia de dois outros astronautas, ele se dirige à órbita lunar para uma série de experimentos. Em 22 de novembro de 1963, a tripulação foi informada de que o presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy havia sido assassinado. A partir desse momento, a expedição começará a dar uma guinada estranha.

A 5ª edição de Le Storie é uma mistura de ficção científica, aventura e percepção psicológica. Bilotta é ótimo em alternar as cenas no espaço com longos flashbacks da infância do protagonista e ainda mostra uma série de presságios sombrios que aparentemente são aleatórios.

Um roteiro onde o início e o fim se confundem e que deixa espaço para a interpretação pessoal do leitor sobre a natureza de alguns eventos críticos. A leitura é fluida e seu único defeito é ter apenas 114 páginas. Mosca também está ótimo. Nos flashbacks ele usa um estilo limpo e claro, depois adota um estilo mais sombrio e com excelente aproveitamento de sombras nas fases da “lua”.

História ótima que lembra alguns filmes como 2001: Uma Odisseia no Espaço ou Lunar (2009).

Até as próximas cinco Le Stories!

Dylan Dog contra a censura

A Mythos vem cumprindo com o prometido e publicando a série regular de Dylan Dog em sequência, para preencher as lacunas deixadas pela publicação ao longo dos anos. Em maio chegamos na 21ª edição intitulada, Os Desaparecidos, publicada originalmente em Dylan Dog #59 (Imagem à esquerda).

Se tudo correr bem, muito em breve chegaremos à edição #69, um marco para o Detetive do Pesadelo. Intitulada no original “Caccia alle Streghe” (Caça às Bruxas), esta história escrita por Tiziano Sclavi com desenhos de Piero Dall’Agnol em 1992 foi uma maneira original e inteligente de Sclavi expressar sua opinião sobre a censura.

Dylan Dog #69 – Caccia Alle Streghe

A história em si é muito simples e distante da abordagem clássica de Sclavi. Dylan está apoiando e auxiliando Justin Moss, um amigo cartunista, cujas obras, devido a algumas cenas de violência e nudez, tem atraído a atenção de padres fanáticos, jornais e políticos determinados a impedir a liberdade de expressão dos autores para evitar que certos conteúdos sejam facilmente encontrados por menores de idade.

 

1ª edição da minissérie Daryl Zed

Um dos personagens criados por Moss é Daryl Zed, personagem que ganhou uma minissérie pela Sergio Bonelli Editore em 2020 em seis edições com 32 páginas cada, coloridas.

A investigação de Dylan fica em segundo plano pois a trama secundária relacionada aos acontecimentos principais é mais importante. Ela foca em um horror mais sutil e cotidiano: a censura, entendida como principal instrumento de controle da massa e assim detendo um poder ilegítimo que mina a liberdade pessoal de cada indivíduo.

Sclavi insere na trama Lord Cherril, líder dos padres fanáticos (na trama de Zed), e o pai da criança que lê Daryl Zed (no mundo real), pai este que chega a acusar Moss por associação criminosa. Através destes personagens Sclavi compara autoridades do presente com inquisidores do passado. Na longa introdução da história e nas páginas finais, estas figuras estão dentro de uma masmorra torturando bruxas e tentando destruir os nossos heróis.

Sclavi vs. Censura

A motivação de Sclavi para escrever esta história foi o duro tratamento que os políticos italianos estavam dando contra os quadrinhos violentos, querendo proibi-los!

Segundo os parlamentares da época, as revistas da editora ACME (em particular a Splatter, Primi Delitti e o jornal Lobotomia), eram perigosas justamente pelo fato de que as crianças conseguiam comprar facilmente nas bancas e assim, serem instigadas pelos seus conteúdos a realizarem atos não convencionais. No processo estava escrito o seguinte:

“Essas publicações podem ou são de fato compradas em bancas de jornais, mesmo por crianças; a propagação da violência contra menores é um fenômeno grave também em nosso país; no entanto, os menores devem também ser protegidos da violência moral que nos fatos denunciados é certamente perpetrada contra eles tanto por quadrinhos, como por contos. Quais as medidas que o Governo e em particular o Ministério do Interior e da Justiça pretendem adotar, de acordo com as tarefas atribuídas a eles por lei na prevenção e supervisão de publicações que contenham incitação ao crime e grave violência moral contra menores.”

Capa da Antologia da Splatter. Uma das capas mais “leves”

Embora Dylan Dog não fizesse parte do grupo de quadrinhos a que o documento se referia, Sclavi acompanhava a onda de censura que varreu o mundo dos quadrinhos no final dos anos oitenta e início dos noventa. Por outro lado, embora não o acertasse diretamente, o conjunto de reclamações, protestos e proibições veem como inimigos incontestáveis o horror e gênero splatter ou gore, que o próprio escritor havia posto no auge com a série que havia idealizado.

Sclavi em uma entrevista para o livro “Antistoria del fumetto italiano, da Pazienza a oggi (publicado em 2004) fala sobre “Caça às Bruxas”: “É um número do qual me orgulho, mas ninguém gostou. Foi a época em que havia muitos imitadores de Dylan Dog. Dylan deu origem a uma série interminável de imitações, não digo ruins, mas muito fortes, com muito gore. Isso até provocou uma questão parlamentar na qual, devo dizer, Dylan Dog nunca entrou. Em toda a polêmica espalhafatosa e sanguinária dos quadrinhos, Dylan Dog nunca foi mencionado nos jornais ou nesta questão parlamentar. Lamento especialmente que um dos signatários desta petição parlamentar tenha sido Luciano Violante.”

Sclavi se referia a um parlamentar comunista que assinou a petição. O fato impressionou tanto o roteirista que ele colocou o assunto na boca de Dylan Dog: “Louco! Dezenas e dezenas de assinaturas! Existe até mesmo a de um comunista!”

Na época, um artigo de Nicoletta Arstrom em resposta aos políticos que criticaram o anime Super Robot, de Go Nagai, o classificando como perigoso e violento, dizia que:

“As crianças não pensam em todos esses problemas. Eles aceitam ou rejeitam os desenhos de acordo com seus gostos, às vezes se revelando mais adultos e mais razoáveis ​​do que aqueles que querem ou podem administrar o que eles podem ver. […] Não há, talvez, nesse tipo de conceito, uma lógica de se comportar como tutores ou censores? Em vez disso, confie nas crianças. Eles são inteligentes!”

Voltando à Caça

De volta à história, ela tenta enfatizar, graças aos desenhos vívidos de Dall’Agnol, o quanto a própria censura gera uma série de atos violentos e/ou incorretos, além de ser ela própria principalmente uma violência moral. No decorrer da trama, de fato, acontece o colapso físico e psicológico de Justin (esteticamente parecido com Silver, diretor da revista Splatter na época); uma série de mentiras (fake news) contra Dylan Dog para aumentar as acusações contra os quadrinhos Daryl Zed; o falso testemunho deliberado dos jornais e a agressão de fãs obstinados que querem seus quadrinhos de volta. Em suma, uma série de golpes, abusos e atos brutais e não convencionais resultantes da censura.

Este enredo, habilmente desenvolvido do início ao fim, cativante, que usa a parte metafórica da história com o protagonista Daryl Zed, uma versão bombada e “americana” do Investigador do Pesadelo criada por Justin, inspirado no próprio amigo Dylan Dog.

 

Tiziano Sclavi usa as primeiras páginas da história para contar metaforicamente tudo o que acontecerá nas páginas seguintes sem revelar o final. Daryl Zed é cercado pelos inquisidores que poderão fechar definitivamente a editora. Além disso, por meio dessa estratégia, leva os leitores a reconhecer Dylan em Daryl Zed e destacar quão grande é o perigo que seu personagem corre.

Ao final, observamos Dylan, em busca de abrigo, chega a uma masmorra que já havia visto no início onde as histórias dos dois heróis acabam se entrelaçando, porém o terror maior é o que Dylan vive:

“Dylan Dog será capaz de se salvar dos Inquisidores?”

Esta edição foi republicada pela Bao Publishing com duas capas variantes, uma de Piero Dall’Agnol e outra de Gigi Cavenago, atual capista de Dylan Dog. E nós, tomara que, muito em breve, possamos ter contato com ela pela Editora Mythos, talvez daqui a poucas edições na série regular ou em uma Graphic Novel.

Mythos anuncia a publicação de Ken Parker

Em live realizada nesta terça-feira (20) no Canal Mythológico, a editora Mythos anunciou a publicação de Ken Parker. Obra máxima de Giancarlo Berardi e Ivo Millazo. Ken Parker estava sendo publicado desde 2000 pela Editora Cluq.

Coleção referência da Mondadori.

A Mythos pretende lançar a edição com base na coleção publicada pela editora italiana Mondadori. Foram 50 volumes com duas histórias cada. Estes volumes compilam toda a série regular, a série publicada em Ken Parker Magazine, os especiais até a última edição publicada por Berardi e Millazo, Até onde vai o amanhecer.

Segundo Joana Rosa Russo, responsável pelo Marketing da Mythos, a pré-venda tem início em junho e as edições serão no formato e tamanho de As Grandes Aventuras de Tex, (apesar da edição da Mondadori ser em formato maior), com capa dura e uma média de 200 páginas, preto e branco. A editora disse que dará mais detalhes sobre a edição em lives na próxima semana.

Mister No e a Mad Maria

Sergio Bonelli era um aventureiro e muitas das histórias que escreveu com o pseudônimo de Guido Nollita saíram de suas aventuras. Em Mister No isso acontece ainda mais, pois Jerry Drake percorre por muitas vezes o caminho trilhado no mundo real por seu criador, Sergio.

Um exemplo disso é a relação de Sergio Bonelli com a Ferrovia Madeira-Mamoré, cuja história foi imortalizada no livro Mad Maria de Márcio de Souza. A intenção era construir uma estrada de ferro de 366 Km no meio da Floresta Amazônica para ligar Guajará-Mirim a Porto Velho.

A Bolívia havia perdido sua faixa litorânea no Pacífico para o Chile, durante a Guerra de Guano em 1883 ficando sem saída para o mar, meio fundamental para uma economia baseada na exportação. Por isso os bolivianos optaram trocar o Acre por uma ferrovia que fosse da fronteira do Brasil ao rio Mamoré e daí, de barco pelos rios Madeira e Amazonas, os produtos bolivianos chegariam ao Atlântico.

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